Desinformação em saúde
A convite do Henry Suzuki, tive a oportunidade de participar de uma conversa com um grupo de profissionais de organizações e setores ligados à saúde, interessados na troca de informações, experiências e soluções em tempos de pandemia.
Fui perguntada pelo Henry como, pessoalmente, enxergava a "epidemia" das informações falsas. Aproveitei a oportunidade para propor uma reflexão sobre:
- atores do fenômeno da desinformação
- ações que podemos ter
- habilidades para pôr em prática essas ações
- iniciativas que estão postas
- o que mais podemos e devemos fazer
Os atores da desinformação
Entre os atores do ecossistema da desinformação podem estar jornalistas não tão bem orientados para o trabalho, que buscam furos de reportagem - às vezes sacrificando a checagem da fonte e dos fatos. Os demais ficam entre os membros de grupos privados que acreditam ser portadores das últimas "notícias", normalmente não apuradas e compartilhadas de forma leviana; na sequência, vêm as pessoas influentes - políticos, cientistas e pseudo cientistas que fazem afirmações de forma açodada sem a devida base de comprovação. Todos eles acabam causando algum tipo de prejuízo - sobretudo num momento como este de pandemia para quem os ouve ou lê e toma decisões baseadas no que foi dito.
Que ações podemos ter nesses casos?
Diante de algo que ouvimos ou lemos - e que julgamos discutível ou improvável, podemos simplesmente ignorar o fato ou procurar checá-lo, para o bem da nossa autodefesa intelectual ... As ações, nesse caso, incluem 3 perguntas básicas:
1. Quem está por detrás da informação?
2. Existem evidências do que está dito?
3. Que outras fontes tratam do mesmo tópico?
Habilidades necessárias
Essas perguntas acima, aparentemente fáceis de responder, demandam habilidades precisas que podem ser desenvolvidas ou aperfeiçoadas, por meio da educação e do cultivo da dúvida como método; são elas: espírito crítico, checagem dos próprios vieses de análise, pesquisa avançada na web e identificação do modus operandi da desinformação. O espírito crítico pergunta por que razões a informação se sustentaria por si - baseada em quê; a checagem dos próprios vieses afasta da análise aspectos que denunciam visões irracionais, tendenciosas etc.; a pesquisa avançada na web conduz a uma busca mais acurada que chega direto ao ponto sem divagações desnecessárias; a identificação do modus operandi da desinformação põe a nu a receita (linguagem, forma, intenção) que foi seguida para que ela viesse à luz com o objetivo de confundir.
Iniciativas que podem inspirar o cultivo dessas habilidades
Felizmente, neste momento difícil, podemos contar com várias iniciativas que podem nos inspirar, provenientes de órgãos ligados à imprensa, universidades e organizações da sociedade civil.
- Projetos internacionais
No campo específico da ciência em ligação com o jornalismo, registro o trabalho desta mídia independente do Canadá Science Press voltada primordialmente para o abastecimento da grande mídia em termos de notícias de cunho científico; a agência promove a educação para o uso das mídias, faz checagem dos fatos e mantém uma seção especial dedicada ao COVID-19 .
Nessa linha, destaco também o brilhante projeto da organização internacional Draft News que serve a jornalistas, acadêmicos e governos, apoiando a sociedade no trato da informação em momentos críticos. A organização vem oferecendo vários webinars em diversas línguas com o foco na questão do COVI-19.
Finalmente, no campo específico da educação, menciono: o inglês News Literacy Project, que oferece recursos gratuitos de combate à desinformação para pais, educadores e jornalistas com o foco em educação para a leitura de notícias (news literacy); o americano COR – Civic Online Reasoning, projeto do The Stanford History Education Group (SHEG), que mantém uma série de cursos voltados à habilidade de avaliar conteúdos online; o da UNESCO, por meio do seu projeto UNESCO Media and Information Literacy response to COVID-19, que vem também oferecendo à comunidade internacional conteúdos valiosos por meio de webinars.
- Projetos nacionais
Dentre os brasileiros, destaco os programas Vaza, Falsiane e EducaMídia que servem efetivamente à educação, ao aprendizado da (aparentemente fácil) habilidade de ler e interpretar os diversos tipos de informação.
Merece especial menção, na área do jornalismo, o excelente trabalho dos fact-chekers brasileiros que, ainda há pouco, lançaram um manifesto contra autoridades que distorcem fatos envolvendo a COVID-19. Ainda nesse campo, a Rede Brasileira de Jornalistas e Comunicadores de Ciências - RedeComCiência vem também atuando fortemente no combate à desinformação no campo da saúde.
O que mais podemos fazer?
Podemos individualmente fazer mais no sentido de amplificar, replicar essas iniciativas. Como?! Seguindo essas fontes nas redes sociais (aprendendo com elas) e não perdendo a oportunidade de falar sobre a importância do combate à desinformação - sobretudo em tempos de pandemia. Isto revela, em última análise, civismo e responsabilidade social.
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